Política

CPI dos Atos Golpistas vota nesta quarta relatório com pedido de indiciamento de Bolsonaro, Cid e mais 59 pessoas

Parecer da senadora Eliziane Gama sugere responsabilização criminal de ex-ministros, ex-auxiliares de Bolsonaro e militares. Governistas projetam ampla margem de apoio ao parecer

A CPI dos Atos Golpistas vota na manhã desta quarta-feira (18) o relatório final elaborado pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA). A discussão do parecer encerrá os trabalhos do colegiado, criado há cinco meses para investigar os ataques às sedes dos Três Poderes, em Brasília.

O documento com mais de 1,3 mil páginas sugere aos órgãos competentes o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seu núcleo de governo, além de generais do Exército e militares de diversas patentes. Ao todo, são atribuídas condutas criminosas a 61 pessoas.

O parecer de Eliziane aponta a depredação de 8 de janeiro como o ato final de uma escalada de movimentos e discursos de incitação a um golpe de Estado.

Segundo ela, as autorias intelectual e moral dos atos são de Jair Bolsonaro. Eliziane Gama defende a responsabilização do ex-presidente em 4 crimes (veja mais abaixo).

“O 8 de janeiro é obra do que chamamos de bolsonarismo. não foi um movimento espontâneo ou desorganizado; foi uma mobilização idealizada, planejada e preparada com antecedência. Os executores foram insuflados e arregimentados por instigadores que definiram de forma coordenada datas, percurso e estratégia de enfrentamento e ocupação dos espaços”, afirmou.

O documento também sinaliza a suposta “omissão” de militares das Forças Armadas e de policiais militares do Distrito Federal como responsáveis pelo avanço desenfreado de vândalos contra patrimônios públicos.

Ao rol de indiciados, Eliziane Gama atribuiu 26 tipos de delitos diferentes. Os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado são os mais frequentes.

Nesta quarta, as conclusões apontadas pela senadora serão apreciadas após o término da fase de discussão, que terá falas de 36 deputados e senadores:

por acordo, membros da CPI terão até 10 minutos para discursar a favor ou contra o parecer;
parlamentares que não integram a CPI terão 3 minutos
encerrada a discussão, a votação terá início e deverá ser nominal
pareceres alternativos —- chamados de votos em separado —- foram apresentados por parlamentares da oposição, mas só serão votados se houver rejeição do documento de Eliziane

Se aprovado, o documento será encaminhado a órgãos responsáveis por promover a responsabilização criminal das condutas elencadas por Eliziane, como o Ministério Público Federal. Cabe a essas instituições dar prosseguimento às investigações e avaliar eventual apresentação de denúncia.

Aliados do governo e a relatora disseram ao g1 que esperam um placar amplo pela aprovação do documento. Parlamentares mais conservadores avaliam ser possível marcar entre 18 e 20 votos favoráveis entre deputados e senadores da CPI mista. Já Eliziane diz acreditar ser possível reunir 21 votos.

Entenda abaixo o teor do parecer e os próximos passos:

o que diz o relatório
crimes atribuídos a Bolsonaro
outros indiciados
o que vem depois da votação

O que diz o relatório
O relatório final de Eliziane Gama focou na teia de aliados e apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, e atribui a esforços empreendidos por ele — antes, durante e depois das eleições de 2022 — como fatores essenciais para os atos golpistas de 8 de janeiro.

O documento contém 314 menções ao nome do ex-presidente e 812 citações ao sobrenome Bolsonaro.

“As investigações aqui realizadas, os depoimentos colhidos, os documentos recebidos permitiram que chegássemos a um nome em evidência e a várias conclusões. O nome é Jair Messias Bolsonaro”, afirmou a senadora.

Segundo Eliziane, o ambiente golpista teria sido incitado deliberadamente por Bolsonaro ao longo de seu mandato. Ela elencou como sinais dessa tentativa as agressões à Justiça Eleitoral, ao Supremo Tribunal Federal e à imprensa, a aproximação ideológica com setores das forças de segurança e militares do país e o aparelhamento de órgãos de inteligência.

“Ainda assim, Jair Bolsonaro perdeu as eleições. O plano inicial — de tomar o poder por dentro — fracassou. […] Sem votos, sem razão e sem hombridade, Jair Bolsonaro — ele mesmo o reconhece, e aqui o demonstramos — buscou ‘alternativas’”, escreveu.
A senadora relembrou a minuta de decreto golpista, a tentativa de buscar apoio junto às Forças Armadas para um golpe de Estado e um estímulo ao “caos social”, com a ausência de reconhecimento da derrota de Bolsonaro no segundo turno das eleições.

Em seu parecer, Eliziane Gama é taxativa ao classificar o 8 de janeiro como uma “tentativa de golpe de Estado”.

“Eles queriam tomar o poder. Eles acreditavam nessa possibilidade. Eles o diziam abertamente: em voz alta, nas redes sociais, em cada faixa ostentada na frente do Quartel-General do Exército. A invasão e a depredação dos prédios públicos seriam apenas o estopim”, disse.
Segundo ela, a invasão só foi possível graças à “omissão premeditada e deliberada” de membros da cúpula da PM do DF; à “conivência e a leniência” de setores das Forças Armadas; e ao “treinamento, preparação, articulação” de vândalos, instigadores e financiadores.

Crimes atribuídos a Bolsonaro
Eliziane Gama atribuiu quatro crimes a Jair Bolsonaro. Na avaliação dela, o ex-presidente foi autor intelectual e moral dos ataques aos Três Poderes, em janeiro deste ano.

Eliziane afirmou que Bolsonaro tem “responsabilidade direta” por “grande parte dos ataques perpetrados a todas as figuras republicanas que impusessem qualquer tipo de empecilho à sua empreitada golpista”.

A senadora avaliou, ainda, que Jair Bolsonaro e seu entorno “compreendiam a violência e o alcance das manifestações” golpistas e, de maneira deliberada, colocavam “mais lenha na fogueira”.

Ela defendeu, então, o indiciamento do ex-presidente pelos seguintes crimes:

associação criminosa — pena de 5 a 10 anos de reclusão, além de multa
tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito — pena de 4 a 8 anos de reclusão, além de pena relacionada ao ato violento
tentativa violenta de depor governo legitimamente constituído (golpe de Estado) — pena de 4 a 12 anos de reclusão, além de pena relacionada ao ato violento
e emprego de medidas para impedir o livre exercício de direitos políticos — pena de 3 a 6 anos de reclusão, além de pena relacionada ao ato violento
Em nota divulgada na terça-feira, a defesa do ex-presidente criticou o relatório e o pedido de indiciamento, argumentando que o parecer é “parcial”.

Outros indiciados
O parecer de Eliziane destacou o envolvimento de militares das Forças Armadas — da ativa ou da reserva — e de policiais militares do DF nos atos de 8 de janeiro.

Dos 61 pedidos de indiciamento, 29 são de membros ou ex-membros das Forças e PMs. Oito generais do Exército aparecem na lista, entre eles o ex-comandante da força terrestre, o general Freire Gomes.

Também é citado o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, que foi apontado, em delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, como o integrante da cúpula das Forças Armadas que teria apoiado a intenção golpista do ex-presidente.

São mencionados ainda 5 ex-ministros e 6 auxiliares diretos de Bolsonaro.

Veja a lista completa a seguir:

ex-presidente Jair Bolsonaro
general Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro e ex-ministro da Casa Civil e da Defesa
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e então secretário de Segurança Pública do DF nos atos
general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional de Bolsonaro
general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro
general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa de Bolsonaro
almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha
general Freire Gomes, ex-comandante do Exército
tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens e principal assessor de Bolsonaro
Filipe Martins, ex-assessor-especial para Assuntos Internacionais de Bolsonaro
deputada federal Carla Zambelli (PL-SP)
coronel Marcelo Costa Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
general Ridauto Lúcio Fernandes
sargento Luis Marcos dos Reis, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
major Ailton Gonçalves Moraes Barros
coronel Elcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde
coronel Jean Lawand Júnior
Marília Ferreira de Alencar, ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF
Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal
general Carlos José Penteado, ex-secretário-executivo do GSI
general Carlos Feitosa Rodrigues, ex-chefe da Secretaria de Coordenação e Segurança Presidencial do GSI
coronel Wanderli Baptista da Silva Junior, ex-diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI
coronel André Luiz Furtado Garcia, ex-coordenador-geral de Segurança de Instalações do GSI
tenente-coronel Alex Marcos Barbosa Santos, ex-coordenador-adjunto da Coordenação Geral de Segurança de Instalações do GSI
capitão José Eduardo Natale, ex-integrante da Coordenadoria de Segurança de Instalações do GSI
sargento Laércio da Costa Júnior, ex-encarregado de segurança de instalações do GSI
coronel Alexandre Santos de Amorim, ex-coordenador-geral de Análise de Risco do GSI
tenente-coronel Jader Silva Santos, ex-subchefe da Coordenadoria de Análise de Risco do GSI
coronel Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da PMDF
coronel Klepter Rosa Gonçalves, subcomandante da PMDF
coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante do Departamento de Operações da PMDF
coronel Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, comandante em exercício do Departamento de Operações da PMDF
coronel Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, comandante do 1º CPR da PMDF
major Flávio Silvestre de Alencar, comandante em exercício do 6º Batalhão da PMDF
major Rafael Pereira Martins, chefe de um dos destacamentos do BPChoque da PMDF
Alexandre Carlos de Souza, policial rodoviário federal
Marcelo de Ávila, policial rodoviário federal
Maurício Junot, empresário
Adauto Lúcio de Mesquita, financiador
Joveci Xavier de Andrade, financiador
Meyer Nigri, empresário
Ricardo Pereira Cunha, financiador
Mauriro Soares de Jesus, financiador
Enric Juvenal da Costa Laureano, financiador
Antônio Galvan, financiador
Jeferson da Rocha, financiador
Vitor Geraldo Gaiardo , financiador
Humberto Falcão, financiador
Luciano Jayme Guimarães, financiador
José Alipio Fernandes da Silveira, financiador
Valdir Edemar Fries, financiador
Júlio Augusto Gomes Nunes, financiador
Joel Ragagnin, influenciador
Lucas Costar Beber, financiador
Alan Juliani, financiador
George Washington de Oliveira Sousa, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
Alan Diego dos Santos, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
Wellington Macedo de Souza, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
Tércio Arnaud, ex-assessor especial de Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”
Fernando Nascimento Pessoa, assessor de Flávio Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”
José Matheus Sales Gomes, ex-assessor especial de Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”

O que vem depois da votação
Para ser aprovado, o documento precisará dos votos da maioria dos membros da CPI mista de deputados e senadores — o que deverá ocorrer, diante da predominância de aliados do Planalto no colegiado.

Se aprovado, o conteúdo será enviado a diversos órgãos que avaliam e decidem pela apresentação de denúncias com base nele. Entre as instituições para as quais o documento é encaminhado estão o Ministério Público Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU).

A relatora espera entregar, já na próxima semana, o documento à chefe interina da Procuradoria-Geral da República (PGR), Elizeta Ramos. A expectativa é que o material seja encaminhado ao subprocurador escalado para acompanhar ações ligadas ao 8 de janeiro no STF, Carlos Frederico Santos.

À TV Globo, Santos afirmou que deverá dar celeridade à análise do material a ser entregue pela CPI.

“Quando tomar conhecimento do relatório e sua extensão é que vou ter uma ideia. Imagino que haja um grande volume de documentos. Mas o nosso objetivo, aqui no Grupo de Combate aos Atos Antidemocráticos, é dar a celeridade devida, mas preservando a qualidade da persecução. Afinal, em última análise, se assim indicarem os documentos, vamos tratar de acusações”, disse.
Entre as hipóteses possíveis para o conteúdo na PGR, estão:

a abertura de novas investigação com base no relatório
a adição de materiais do relatório a apuração já em andamento
oferecimento de novas denúncias
arquivamento
Por lei, após o encaminhamento, o Ministério Público terá até 30 dias para dizer ao colegiado se houve adoção de medidas em relação às conclusões previstas no parecer.

Além da fase de responsabilização criminal, após a aprovação do parecer, também serão encaminhadas as propostas e recomendações elencadas por Eliziane Gama.

Parte deverá ir ao Congresso como projetos de lei. Entre os textos estão:

Outra parte do relatório será enviada ao governo. Uma das propostas prevê que militares em cargos civis sejam julgados, por faltas disciplinares, nos órgãos aos quais estão vinculados, e não pelas instâncias militares.

Fonte: G1

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