Em um mundo em que a coragem se transforma em força e a esperança brilha mais forte que nunca, o câncer de mama esbarra em mulheres fortes, que se recusam a se render. Juntas, elas compõem a paleta cor de rosa de resiliência, amor e determinação, revelando ao mundo que a batalha contra a doença é uma história de superação que merece ser contada. Por isso, são retratadas nas telas da vida como símbolos de amor-próprio.
Neste último fim de semana de outubro, contamos as histórias de Cristina Roberto, Eciliane de Sousa, Wanessa Andrade e Rosa Maria Mororó, que personificam a vitória diante da guerra contra o câncer de mama. Ou melhor, cânceres de mama e seus diversos tratamentos, como bem explica o médico Cristiano Resende, oncologista da Oncoclínicas Brasília e especialista em câncer de mama. “O tratamento envolve várias abordagens, dependendo do estágio e do subtipo. Isso inclui cirurgia, radioterapia e tratamento medicamentoso como quimioterapia, endocrinoterapia, terapia alvo e imunoterapia.”
O acompanhamento médico é vital, com consultas regulares, exames laboratoriais e mamografias anuais. O apoio multidisciplinar, chamado de survivorship, garante o bem-estar pós-tratamento e vem sendo cada vez mais estudado, valorizado e disseminado, inclusive em congressos médicos. O suporte multidisciplinar feito por meio da equipe médica, nutricionistas, enfermeiros e psicólogos é fundamental para reinserir a mulher em sua vida pessoal e profissional.
O estigma e o medo do câncer de mama são desafiadores, mas a informação de qualidade e o suporte podem mudar a perspectiva. A evolução nos tratamentos aumentou as chances de cura e melhorou a qualidade de vida após a doença. “Ter o diagnóstico de câncer de mama nunca é uma situação fácil. O desconhecimento e o medo, associados à imagem pré-concebida das mutilações e limitações que o tratamento dessa neoplasia envolve, assim como a finitude da vida, geralmente pautam a primeira consulta de uma paciente recém-diagnosticada”, reforça Cristiano.
Uma pesquisa do Datafolha revela que a maioria das mulheres se considera bem-informada sobre o câncer de mama, mas possui pouca compreensão sobre os tipos da doença e seus estágios. A empresa Gilead Sciences divulgou um estudo que destaca a falta de equidade na saúde, especialmente entre mulheres negras de classes C/D e com níveis mais baixos de escolaridade. O câncer de mama é uma das principais causas de morte entre as mulheres, tornando a informação e o diagnóstico precoce cruciais.
Nas regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil, por exemplo, cerca de 49% das mulheres reconhecem que têm conhecimento limitado ou insuficiente sobre a doença. Entre as mais jovens, com idades entre 25 e 29 anos, esse índice atinge 45%. Além disso, outras categorias que demonstraram enfrentar desafios na obtenção de informações adequadas foram pessoas das classes D/E (42%); as que possuem apenas o ensino fundamental (36%); e mulheres negras (35%).
Cristina, Eciliane, Wanessa e Rosa Maria vivem hoje uma nova filosofia de vida, seja ressignificando o lado profissional, produzindo um livro, cursando uma faculdade ou viajando o Brasil dentro de uma Doblô. Cada dedicação se tornou um refúgio de conexão e aprendizado, espalhando a mensagem de respeito ao próprio corpo e vivendo com gratidão.
Mudança de hábitos
Na trajetória de Cristina Roberto, 68 anos, cada detalhe assume uma importância única, uma peça fundamental no quebra-cabeça de sua jornada de superação após o diagnóstico de câncer de mama. Cada ação, cada escolha, cada passo tomado é um fragmento de sua história, composta com cuidado e determinação. “Quando eu recebi o diagnóstico, eu me disse assim: ‘agora, você é sua, cuide de você!’.”
Esta determinação a levou a uma busca incansável por conhecimento. E um livro se tornou seu guia: Dieta anticâncer, do médico e pesquisador francês David Servan-Schreiber. A obra não apenas delineou um protocolo de tratamento, mas também enfatizou a necessidade de assumir o controle da própria saúde.
“Fiquei procurando coisas de autocuidado. E teve algo que foi muito importante para mim, que é o livro de um médico que teve um câncer, conviveu com isso por 20 anos, fez um trabalho maravilhoso de pesquisa e de mudança de hábitos. Ele tinha um tumor superagressivo e conseguiu viver muitos anos bons, com exercícios, horário de dormir, para comer. E eu fui colocando isso na minha vida”, detalha.
Cristina admite que tinha uma vida muito estressada. Dona de um bufê, fazia vários eventos. “Era uma correria para lá e para cá. Eu não dormia e não comia direito. Respeitar o seu corpo, o horário de comer, de dormir e de acordar é fundamental. O ciclo circadiano é real e ele precisa ser respeitado, o nosso corpo tem um reloginho próprio.”
A alimentação se tornou um elemento crítico em sua busca pela cura. A eliminação do açúcar de sua dieta foi uma decisão marcante. Ela mergulhou nos princípios da medicina chinesa e Ayurveda, buscando equilíbrio e vitalidade por meio da comida.
Hoje, Cristina comanda seu próprio restaurante, o Cura Cozinha Orgânica. O novo trabalho permitiu encontrar alegria na interação com as pessoas, tornando um local de conexão, onde compartilha sua sabedoria e amor com aqueles que a visitam. Apesar dos desafios, aprecia a interação com clientes, e o restaurante a ajudou a lidar com preocupações de saúde e a sensação de envelhecimento, proporcionando-lhe gratidão pela oportunidade de viver essa experiência.
“Quando eu vejo o pau quebrando, eu entro e ajudo a servir e faço todas as coisas que é preciso. Tenho trabalhado bastante, às vezes é cansativo, porém me permitiu interagir mais com as pessoas e reacender minha vida social, então isso está sendo muito rico para mim.”
Respeitando o próprio corpo
Após o diagnóstico, Cristina buscou uma nutricionista e incorporou exercícios físicos à sua vida, fortalecendo corpo e mente. “Ela me deu algumas vitaminas, então isso me aprumou, porque o meu diagnóstico chegou no meio da pandemia, em 2021, e eu tinha tido outros problemas de saúde, uma diverticulite muito pesada, e estava muito debilitada fisicamente, então o primeiro caminho foi fortalecer meus músculos. Caminhadas diárias e a prática da meditação me tornaram mais forte, não apenas fisicamente, mas também emocionalmente. Eu acho que isso é muito importante para enfrentar uma cirurgia e um tratamento.”
Além disso, encontrou apoio em óleos como o canabidiol (CBD) e derivados da cannabis, que proporcionaram serenidade e aceitação durante sua jornada e desempenharam um papel surpreendente, oferecendo uma sensação de paz e aceitação para enfrentar o câncer de maneira mais suave e suportável.
Cuidando do coração
É essencial lembrar que a vitória contra essa doença não marca o fim da jornada. Para milhares de mulheres, após a fase do tratamento, inicia-se uma nova batalha, muitas vezes negligenciada: a proteção do coração. Com base na estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca), de 73.610 novos casos de câncer de mama no Brasil em 2023, o Outubro Rosa traz à tona não apenas a importância da detecção precoce, mas também a necessidade de entender os desafios que surgem após a vitória na luta contra o câncer.
Uma pesquisa conduzida pelo Journal of Cancer revelou que mulheres sobreviventes do câncer de mama enfrentam um risco significativamente maior de desenvolver doenças cardiovasculares. A cardiologista Edna Marques, eletrofisiologista do Instituto do Coração de Taguatinga (ICTCor), alerta para os perigos potenciais que podem surgir durante e após o tratamento, relacionados a medicamentos e terapias específicas, como os inibidores de aromatase.
É fundamental que essas mulheres compreendam a importância do acompanhamento cardiológico e a identificação precoce de sintomas que podem indicar problemas cardiovasculares. Muitas vezes, os sintomas de infarto nas mulheres são diferentes e subestimados, o que destaca a necessidade de educação sobre a saúde cardíaca.
Edna Marques também destaca fatores de risco, como hipertensão, tabagismo, obesidade e depressão, que podem agravar essas condições. Dietas equilibradas e atividades físicas desempenham um papel crucial na prevenção de doenças cardíacas e câncer.
Sonho que nasce da empatia
Pacientes acometidos pelo câncer comumente desabafam sobre como o diagnóstico costuma vir acompanhado pelo amargo gosto da angústia e do receio daquilo que era, até então, desconhecido pelo próprio corpo. Com Eciliane de Sousa, 37 anos, não foi diferente. Ela lembra o quão aflitivo foi o período em que teve de conviver com a doença, mas expõe a felicidade de ter encontrado uma nova paixão no caminho até a cura — a psicologia.
Aos 35 anos, Eciliane vivia uma rotina considerada normal. Alternava os cuidados com as filhas, a mais velha, à época, com 15 e as gêmeas de 9 anos, com os trabalhos, os estudos voltados para concurso público e a prática de atividades físicas, quando possível. Diligente com a saúde, sempre fez questão de observar o próprio corpo e percebeu, em um dia como qualquer outro, uma mancha avermelhada, sem nodulação, em sua mama — imediato motivo para preocupação.
Buscando entender do que se tratava a alteração, foi avaliada por quatro médicos da família, sendo que todos falaram que se tratava de mastite, uma inflamação nas glândulas mamárias. Voltou para casa, mas, pouco tempo depois, a mancha passou a coçar e a esquentar, então recorreu a uma ultrassom, que novamente não apontou nenhuma anormalidade.
Tranquila por estar, aparentemente, tudo bem, Eciliane viajou para o Maranhão, sua terra natal, e foi lá que percebeu que, de fato, havia algo errado, pois, com o passar dos dias, a mama apresentava cada vez mais características duvidosas. Ainda no Nordeste, buscou um médico, que solicitou uma biópsia. Poucos dias depois, recebeu o diagnóstico de câncer de mama HER2 positivo.
“Foi devastador e angustiante, mas, para mim, o pior não foram os sintomas nem os efeitos dos medicamentos, mas a queda do cabelo. Passar a mão e sentir as mechas caindo foi como uma cena de terror.” É assim que Eciliane descreve os momentos que sucederam o diagnóstico, foram 16 sessões de quimioterapias realizadas em meio a uma depressão profunda.
Para cuidar da saúde mental e aliviar os sintomas de desânimo e isolamento que a acometeram, teve de ir à terapia, entretanto as consultas foram exatamente o contrário do esperado. “Eu passei por alguns psicólogos, mas eu me senti pior do que já estava. Eles falavam coisas como ‘eu sinto muito’, ‘eu sei pelo que você está passando’ e, naquele momento, ninguém sabia pelo que eu estava passando porque nenhum daqueles profissionais tinham câncer, então, não, eles não sabiam da minha dor nem da sensação angustiante de observar os cabelos caírem sem poder fazer nada.”
Com a mãe morando no Maranhão e as filhas ainda menores de idade, Eciliane precisou ir às consultas e frequentar a terapia sozinha, o que a deixou ainda mais vulnerável. Para que pudesse focar inteiramente no tratamento, a mãe de Eciliane veio a Brasília em dezembro de 2022, e, após acompanhar a cirurgia de mastectomia da filha, levou as netas para passarem um tempo com ela no outro estado.
Em 2023, Eciliane segue indo em consultas para fazer acompanhamento, especialmente por ter sido diagnosticada com um tipo delicado da doença, mas conta, emanando gratidão, que olha para trás e ri. Praticante da religião evangélica, acredita que a sua fé foi um dos pilares principais para que pudesse ser curada.
Um novo caminho
Movida pelo nó na garganta que vivenciava sempre que não se sentia acolhida durante as consultas de terapia, Eciliane tomou uma decisão que nunca havia cogitado antes — estudar psicologia. Conseguiu bolsa integral para capacitar-se no tão sonhado curso e, então, ingressou na Faculdade Mauá, no início de 2023. Agora, cursando o segundo semestre, conta que busca conhecimento para ajudar homens, mulheres e crianças diagnosticadas com câncer.
“A vontade de cursar psicologia nasceu a partir do momento que eu não senti o acolhimento adequado para mim. Muitas vezes, por não se sentirem acolhidos, pacientes desistem do tratamento e, quando têm metástase, desconhecem a existência das casas de acolhimento, desacreditam que existe a possibilidade de cura e que podem, sim, ter qualidade de vida durante o percurso do tratamento.”
Eciliane conta que ninguém a informou sobre os projetos que abraçam pacientes oncológicos e que tudo o que sabe é conhecimento adquirido por ter ido atrás, sozinha. No empenho por buscar informações, conheceu projetos que a ajudaram de forma inimaginável. Por meio do Hospital Regional da Asa Norte, (HRAN) descobriu a Recomeçar. “Ela me deu um suporte maravilhoso, deu a minha prótese e mostrou os meus direitos e as medicações disponíveis para o tratamento. Na Sara Mulher, instituição em Águas Lindas de Goiás, eu tive apoio psicológico e jurídico, além de me oferecerem cesta básica e pagarem o meu aluguel durante todo o processo. “
A agora estudante declara querer trabalhar incansavelmente para que os pacientes oncológicos estejam sempre informados sobre os seus direitos, pois foi a informação que a fez não desistir. “Existe vida com qualidade depois do câncer, existe uma evolução contínua dos tratamentos de combate ao câncer de mama, as tecnologias favorecem o tratamento e quanto mais precoce descoberto, melhor. Você, mulher, não pode desistir da vida, pois dentro de você habita uma avó, uma mãe, uma filha e uma tia e você pode, sim, ser exemplo de força.”
Cuidado integral
Para além do histórico familiar, fatores ambientais são profundamente relevantes no diagnóstico do câncer de mama. Ingestão de bebida alcoólica, sobrepeso e obesidade, inatividade física e exposição à radiação ionizante podem estimular o aparecimento da doença.
Letícia Có, fisioterapeuta e profissional de educação física, aponta que nos últimos anos o número de estudos que relacionam a atividade física à prevenção do câncer de mama tem aumentado. “A prática de atividade física incorporada na rotina é um fator importante na prevenção, pois ajuda a promover um equilíbrio nos níveis hormonais e um fortalecimento do sistema imune.”
Quanto aos exercícios, durante e após o tratamento, há evidências de que a atividade física reduz o risco de mortalidade em decorrência da doença. A profissional explica que, com a prática dos exercícios, alguns efeitos colaterais, como linfedema, fadiga e fraqueza, sintomas depressivos e ganho de peso, podem ser atenuados, além de melhorar a qualidade de vida dos sobreviventes do câncer. “De forma geral, a atividade física é tolerável e segura durante o tratamento oncológico, porém é importante avaliar as contraindicações e particularidades de cada pessoa, além dos possíveis efeitos adversos causados pelo tratamento.”
Suelen Lima, nutricionista oncológica da Oncoclínicas Brasília, destaca a importância da alimentação durante o tratamento, incluindo o suporte nutricional de um profissional especializado. Alimentos ricos em antioxidantes, como frutas vermelhas e vegetais, ajudam a proteger as células saudáveis. “Manter a hidratação é fundamental para reduzir os efeitos colaterais dos tratamentos. Uma dieta equilibrada com foco em proteínas magras, grãos integrais e a limitação de carboidratos simples é eficaz.”
Alimentos como gengibre em pó, açafrão, ferro, carnes magras, peixes ricos em ômega-3 podem ser benéficos. Pequenas refeições ao longo do dia são recomendadas para pacientes com inapetência. A prevenção da recidiva do câncer de mama envolve hábitos saudáveis, enfatizando alimentos vegetais, controle de estresse, alimentos in natura, atividade física, microbiota intestinal saudável, sono regular e manutenção do peso. Isso contribui para uma maior remissão e qualidade de vida.
Luciana Hotz, fundadora e presidente do Instituto Oncoguia, ressalta que é essencial que os pacientes conheçam os próprios direitos para que, assim, alcancem bem-estar e qualidade de vida durante o tratamento. “Para a gente ajudar esses pacientes, é necessário bater na tecla do que não é qualidade de vida. Ter dor, náuseas e vômito não é qualidade de vida, o impacto na questão financeira não é qualidade de vida. Aqui no Oncoguia a gente tem discutido essa questão de explicar para o paciente coisas que não são normais e que não podem fazer parte do tratamento para que geremos um modo mais consciente de se cuidar.”
Saúde mental
Falar sobre saúde mental também é essencial. Segundo a Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), a depressão é o transtorno psiquiátrico mais comum em pacientes com câncer, com prevalência variando de 22% a 29%. A psicóloga Vanessa Mello afirma que o acompanhamento psicológico, no caso de pacientes oncológicos, serve exatamente para que consigam lidar com as emoções que aparecerão ao longo do processo.
“Para lidar com todos esses sentimentos, como a tristeza, a raiva e o medo de morrer, o paciente precisa de ajuda profissional, porque os amigos e a família não conseguirão lidar da mesma forma e, muitas vezes, também estarão tristes e chateados. Por isso, é importante ter um espaço com uma escuta qualificada para ouvir.” Vanessa salienta que, para mulheres diagnosticadas com o câncer de mama, o acompanhamento auxilia nas questões que surgem acerca da sexualidade e da feminilidade, que são normalmente abaladas após as intervenções cirúrgicas.
De acordo com a psicóloga, estar com a saúde mental preservada contribui para o êxito do tratamento, porque o emocional influencia diretamente no sistema imunológico. “Já existem estudos que falam da questão psicossomática, que relaciona o emocional com as doenças. Então, toda doença pode ser, de certa forma, criada ou piorada, a depender do estado emocional.”
O desabrochar da Rosa
Rosa Maria Mororó, 51 anos, trabalhava em órgão público há quase 20 quando repentinamente teve de encarar um diagnóstico de câncer de mama. Mãe de dois filhos e avó de três, conta que não se orgulha de como levava a vida antes da doença. Doava-se integralmente aos cuidados com a casa, não praticava nenhum exercício, alimentava-se mal e vivia desde a adolescência às sombras da angústia, insegurança e depressão.
Apesar dos maus hábitos, nunca deixou de realizar os exames periódicos anualmente e os resultados eram sempre bons. Contudo, em 2016, por meio de uma ecografia, o médico notou a presença de um pequeno nódulo e alertou Rosa de que ele deveria ser acompanhado.
A próxima consulta, porém, aconteceria somente no ano seguinte. Mas, meses depois da visita ao médico, Rosa teve um sonho em que acredita ter recebido um alerta. “Eu estava com uma dor na barriga, por ter feito alguns abdominais e, no sonho, escutei uma voz que falava que na barriga não era nada, mas que o meu peito me daria um pouco de trabalho. De acordo com o que eu acredito, o Espírito Santo falou comigo.”
Rosa acordou preocupada e logo se lembrou dos exames que havia feito tempos antes, passou a apalpar a mama esquerda, no entanto não notou a presença de nada diferente. “O nódulo que apareceu na mama esquerda durante o exame era minúsculo, milimétrico, muito pequeno e sem formato suspeito.”
Em junho de 2017, Rosa voltou ao consultório para repetir o exame e, mais uma vez, foi tranquilizada pelo médico, que a informou que o nódulo não havia crescido e estava exatamente igual. Desinquieta, porém, com o que havia escutado no sonho, explicou a situação ao profissional, que concordou em fazer um exame específico para que a paciente pudesse dormir tranquila.
Em uma segunda-feira de manhã, no mês de agosto de 2017, recebeu a notícia que tanto temia. “Recebi o resultado ‘nódulo ductal invasivo grau 3 — carcinoma’. Fui pesquisar e descobri que era um câncer, então veio aquele momento em que eu perdi o chão e fiquei emotiva.”
Rosa acredita que os fatores emocionais contribuíram diretamente para que a doença se manifestasse em seu corpo. Recebeu a notícia de que estava com a doença dois anos após o divórcio de um casamento de 26 anos. “A minha alma era triste, então o meu corpo gritou. Nenhuma mulher da minha família havia sido diagnosticada com esse câncer antes, eu fui a primeira.”
Rosa conta que, à época, tinha acabado de iniciar um namoro e que o parceiro, Sávio Mororó, 58, foi essencial para que pudesse superar a doença com sucesso. “Eu não sabia como contar para ele. A primeira esposa, com quem ele conviveu por muitos anos, faleceu de câncer de mama e eu cheguei na vida dele pouco tempo depois. Imaginei que ele não aceitaria passar por isso novamente.”
Sávio não desistiu da relação; muito pelo contrário, declarou que a entregaria total apoio. Apenas dois dias depois do diagnóstico, fizeram uma união estável para que Rosa pudesse ter direito ao plano de saúde do companheiro. Ela conta, orgulhosa, que em todas as consultas e nas sete cirurgias, Sávio se fez e se faz presente ainda hoje.
Um pós de descobertas
Desde o diagnóstico, Rosa imergiu em uma jornada de autoconhecimento. Logo que as sessões de quimioterapias começaram, passou a visitar nutricionistas e psicólogos, mudando a forma de se alimentar e abordando na terapia não só as reflexões sobre a doença, mas sobre tudo que a atormentava anteriormente e que antes acreditava ser normal.
Todas as distrações que pudessem contribuir para o sucesso do tratamento foram aceitas. “Em meio às cirurgias, eu fui autorizada pelo meu médico a viajar. Fazia parte da terapia, eu esqueci que tinha tratamento, esqueci que estava com cirurgia marcada.”
Durante a árdua trilha do tratamento, o inchaço no corpo se tornou evidente e, mesmo com a alimentação monitorada, Rosa teve sobrepeso, então as caminhadas e os exercícios leves faziam parte do dia a dia, enquanto a quimioterapia acontecia.
Após as cirurgias para reconstrução da mama e colocação das próteses, Rosa teve complicações e o emocional, que estava ótimo, acabou abalado novamente. “Eu tive uma infecção e foi necessário retirar a prótese da mama esquerda. O meu emocional fraquejou naquele momento, porque mexeu bastante com a minha autoestima.”
A última cirurgia para reconstrução aconteceu em 4 de setembro de 2022 e, agora, Rosa faz fisioterapia, consultas periódicas de acompanhamento e frequenta academia, além de participar do projeto Canomama, voltado para mulheres que tiveram câncer de mama. “Eu era outra pessoa antes. A tristeza me consumia, minha alma era abatida e o meu corpo gritou, ficando doente, então eu tive que curar a minha alma para curar o meu corpo.”
Hoje, Rosa leva uma vida completamente diferente da que costumava ter. “Eu sou cheia de cicatrizes no corpo, mas sinto a minha alma curada. Quero falar para outras mulheres, que podem ter adoecido também pelo estilo de vida que levavam, para se revigorarem, se reinventarem e entenderem que são novas pessoas, com uma nova oportunidade dada por Deus.”
Para além das atividades físicas, da alimentação saudável e do remo no lago, Rosa, ao lado do esposo e da cadelinha Megan, descobriu uma nova paixão: viajar. Juntos, compraram uma Doblô, onde montaram uma cama, anexaram um fogão e uma minigeladeira e fazem pequenas viagens. “Eu já conheci vários lugares, O Cânion do Xingó, o Rio São Francisco, Porto de Galinhas. A gente dorme dentro do carro, em postos de gasolina e estacionamentos.”
A tristeza era um sentimento tão corriqueiro na vida de Rosa, que todos que a conheciam antes da doença se admiram com a mulher em que ela se converteu. “Minha amiga brinca que antes eu era uma rosa murcha e que agora sou uma rosa que, finalmente, desabrochou.”
Leveza e confiança
Após vencer o câncer de mama por duas vezes, Wanessa Andrade transformou sua experiência em uma missão de compartilhar força e otimismo com outros guerreiros da doença. Graduada e pós-graduada em administração de empresas, apaixonada pelas terapias integrativas, conta que sua missão é servir a todas as mulheres que passaram pelo tratamento e pensam que a saída é se entregar à doença.
“Neste primeiro trabalho, meu objetivo é falar da minha experiência e de outras pacientes que enfrentaram a doença com leveza e confiança. Trazer para as sobreviventes informações importantes sobre os direitos legais de cada uma de nós, que, às vezes por pura desinformação, não têm o tratamento que deveriam ter.”
Wanessa travou sua primeira batalha contra o câncer de mama em 2015, quando tinha 38 anos. Em outubro de 2022, a doença surgiu novamente em sua axila. O que poderia ter abalado a fez ter coragem para enfrentar a situação. “Eu sempre tratei o câncer como uma doença, por que não dizer uma gripe”, diz Wanessa, destacando que, apesar das cirurgias e da radioterapia, sua trajetória é marcada pela ausência de reações negativas.
Para a administradora, superar o câncer é mais do que apenas vencer a doença; é sobre superar os desafios que vêm com ela. Seu tratamento terminou em setembro de 2023, mas as medicações continuarão por uma década. Ela não apenas sobreviveu, mas prosperou e transformou sua experiência em uma oportunidade de ajudar os outros.
Voz ativa
Durante sua segunda batalha contra o câncer, Wanessa enfrentou desafios pessoais e profissionais, incluindo problemas com plano de saúde e INSS. Contudo, vê essas dificuldades como lições valiosas que a fortaleceram. Hoje, é uma voz ativa de apoio para outras mulheres. Ela lançou o e-book Estou com câncer de mama, e agora?, repleto de conselhos e dicas, compartilhando sua mensagem de que o tratamento pode ser mais leve do que se imagina, e de que, mesmo nos momentos mais desafiadores, é possível encontrar oportunidades de crescimento.
A escritora também adotou um estilo de vida saudável após o tratamento, incluindo exercícios físicos e reeducação alimentar. Além disso, envolve-se em terapias integrativas e trabalha com pessoas que enfrentam desafios semelhantes. Seu compromisso é ajudar os outros a encontrar bem-estar físico e mental.
“O e-book é um presente para as mulheres que enfrentaram ou enfrentam a doença. O câncer de mama não é o fim, mas, sim, um capítulo em nossa história de vida. Com determinação, esperança e amor podemos superá-lo, inspirando outros pelo caminho. Juntas, podemos mostrar ao mundo que a força interior é a chave para enfrentar qualquer desafio.”
Os homens não estão livres
“O câncer de mama em homens é um evento raro, por isso não existe recomendação de mamografia de rastreio no sexo masculino. Mas, apesar de raro, pode acontecer, e os sintomas são exatamente os mesmos das mulheres: nódulo palpável, endurecimento da glândula mamária, rachadura ou erosão da pele, vermelhidão na mama, etc. É sempre importante lembrar que o câncer de mama em homens é um alerta para testagem genética para avaliar predisposição hereditária ao câncer.”
Causas e fatores de risco
O câncer de mama pode surgir por inúmeras causas, ou seja, temos mais de um fator de risco. Os fatores de risco mais relevantes são:
Idade: principalmente após os 50 anos.
Fatores endócrinos e reprodutivos: primeira menstruação em idade precoce; menopausa tardia; mulheres que não tiveram filhos ou que tiveram o primeiro filho em idade tardia; mulheres que não amamentaram; uso de terapias hormonais como anticoncepcional oral.
Fatores hereditários: parentes próximos com câncer de mama; câncer de ovário ou câncer de mama masculino na família; portadores de mutações em determinados genes que predispõem ao desenvolvimento de neoplasia.
Fatores ambientais e comportamentais: sobrepeso e obesidade; ingesta de bebidas alcoólicas e exposição à radiação ionizante.
Fonte: Cristiano Resende, oncologista da Oncoclínicas Brasília e especialista em câncer de mama
Remando contra o câncer
Gerido pela Associação Canomama, uma entidade sem fins lucrativos, o Canomama é um projeto social que tem como objetivo desenvolver a prática de atividade física entre mulheres sobreviventes do câncer de mama.
O projeto realiza canoagem coletiva, na modalidade dragon boat. Larissa Lima, fundadora e presidente da associação, explica que a canoagem é um esporte que proporciona exercício físico vigoroso com os membros superiores. “Esses exercícios possuem comprovação científica na prevenção do linfedema e na recidiva do câncer de mama, além de atuar de forma colateral na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, bem como no bem-estar física e emocional e na prevenção de doenças biopsicossocial.”
Larissa conta que o dragon boat é símbolo do câncer de mama em todo o planeta e foi escolhido especialmente pelas características técnicas. Por ser uma embarcação em que os remadores remam apenas para um lado, promove o acolhimento de qualquer mulher que, eventualmente, possa ter limitação de movimento do lado em que foi acometida pelo câncer. Além disso, a canoa tem um tambor, responsável pelo ritmo, no qual uma mulher precisa tocá-lo. Essa função acolhe aquelas com limitação nos dois braços, assim como o leme, que dá a direção à canoa.
A embarcação dragon boat utilizada pelo projeto possui lugares para 22 mulheres, o que contribui para o trabalho em equipe e impulsiona o convívio social. “Hoje, o projeto possui 56 mulheres inscritas, e nossa luta como associação é conseguir parcerias públicas ou privadas para ampliar o atendimento e levar esse benefício para mais mulheres.”
Qualquer mulher que esteja passando por tratamento ou já tenha passado pelo câncer de mama pode participar. Para isso, é necessário entrar em contato, agendar aula experimental e, posteriormente, cumprir o protocolo de acesso ao projeto. Após aprovação, está liberado participar das atividades.
Serviço
As aulas acontecem terças, quintas e sábados, das 9 às 11h, no Clube Ascade Náutica
Fonte: Correios Braziliense