Investigação revela que o golpe só não se consumou por “circunstâncias alheias” à vontade de Bolsonaro, relatório de mais de 800 páginas teve sigilo retirado na terça
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) “planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva dos atos executórios realizados pela organização criminosa que objetivava a concretização de um Golpe de Estado e da Abolição do Estado Democrático de Direito”. A citação está no relatório da Polícia Federal (PF) que pede o indiciamento do ex-presidente e de mais 36 pessoas próximas a ele.
O relatório com mais de 800 páginas foi tornado público na terça, 26, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR). Cabe ao procurador-geral, Paulo Gonet, decidir se, a partir da investigação da PF, oferecerá uma denúncia sobre a tentativa de golpe de Estado.
Entre os envolvidos há vários militares ligados a unidades do Exército instaladas em Goiânia, todos oficiais e de grupos de elite como os chamados ‘kids pretos’, incluindo um general que comandou a força. A investigação mostrou grande atuação desse grupo na organização da trama golpista.
Fundado em provas, o relatório aponta que o golpe somente não se consumou por “circunstâncias alheias” à vontade de Bolsonaro.
Na segunda-feira (25), em entrevista a jornalistas, Bolsonaro se disse inocente e perseguido pela Justiça.
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Entretanto, o relatório da PF sustenta o oposto. “O arcabouço probatório colhido indica que o grupo investigado, liderado por JAIR BOLSONARO, à época presidente da República, criou, desenvolveu e disseminou a narrativa falsa da existência de vulnerabilidade e fraude no sistema eletrônico de votação do País desde o ano de 2019”.
Conforme a investigação, a intenção era estabelecer uma “falsa realidade de fraude eleitoral” para que sua derrota não fosse interpretada como um acaso e servir de “fundamento para os atos que se sucederam após a derrota do então candidato Jair Bolsonaro no pleito de 2022”.
Inquérito apontou formação de seis núcleos para organizar o golpe:
- Núcleo responsável por incitar militares a aderirem ao golpe
- Núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio a outros núcleos
- Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
- Núcleo Jurídico
- Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
- Núcleo de Inteligência Paralela
A PF indiciou os acusados pelos crimes de:
- Associação criminosa;
- Violência política;
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Golpe de Estado
Apesar de derrubar o sigilo sobre o relatório dos investigadores, Moraes preferiu manter a confidencialidade sobre a delação premiada do coronel Mauro Barbosa Cid, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
PF afirma que Bolsonaro elaborou minuta golpista
A PF afirma que, com apoio do núcleo jurídico, Bolsonaro elaborou o decreto conhecido como minuta golpista, que previa a ruptura institucional e a posse de Lula como presidente eleito. O texto estabelecia a decretação do Estado de Defesa no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral e a criação da Comissão de Regularidade Eleitoral para apurar a legalidade do processo eleitoral. A assinatura do documento por Bolsonaro abriria espaço para um golpe.
Texto: Marília Assunção
Foto: Valter Campanato / Agência Brasil