Aprovada em fevereiro de 2022 pela Câmara dos Deputados, a PEC estava paralisada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado desde agosto de 2023
Vista aérea das praias de Ipanema e Leblon (Foto: RioTur)
O Senado Federal retomou nesta segunda-feira, 27, o debate sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, que visa transferir a propriedade dos terrenos litorâneos do Brasil, atualmente sob domínio da Marinha, para estados, municípios e proprietários privados.
Aprovada em fevereiro de 2022 pela Câmara dos Deputados, a PEC estava paralisada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado desde agosto de 2023.
Uma audiência pública vai discutir o tema, sob a relatoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), enfrentando resistência da base governista. Organizações ambientalistas alertam que a proposta pode levar à privatização das praias por empreendimentos privados, ameaçando a biodiversidade do litoral brasileiro. Além das praias, a Marinha possui a propriedade de margens de rios e lagoas influenciadas pelas marés.
De acordo com o Observatório do Clima à Agência Brasil, “esse é mais um projeto do Pacote da Destruição prestes a ser votado. Isso põe em risco todo o nosso litoral, a segurança nacional, a economia das comunidades costeiras e nossa adaptação às mudanças climáticas”.
Entidades de defesa do clima e do meio ambiente destacam que os terrenos da Marinha atuam como barreiras naturais contra enchentes, deslizamentos e eventos climáticos extremos.
“Essa defesa é essencial para a nossa segurança e resiliência. Essas áreas preservam nossa biodiversidade e equilíbrio dos ecossistemas costeiros. Privatização pode trazer danos irreversíveis”, afirmou o Observatório, em nota.
Ao Jornal Opção, o senador por Goiás, Jorge Kajuru (PSB), disse que terá uma reunião com sua bancada nesta terça-feira, 28, a respeito do tema.
“Só amanhã nós vamos ter posição. Eu não dou posição sem ouvir os meus liderados, tenho senadores experientes demais, que me querem como líder até o final do meu mandato. Cid Gomes, Flávio Arns, Chico Rodrigues, então eu não faço nada sem conversar com eles”, afirmou.
A PEC exclui o inciso VII do artigo 20 da Constituição, que afirma que os terrenos da Marinha são de propriedade da União, transferindo gratuitamente para os estados e municípios “as áreas afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos”.
Para os proprietários privados, o texto prevê a transferência mediante pagamento para aqueles inscritos regularmente “no órgão de gestão do patrimônio da União até a data de publicação” da Emenda à Constituição. Além disso, autoriza a transferência da propriedade para ocupantes “não inscritos”, “desde que a ocupação tenha ocorrido pelo menos cinco anos antes da data de publicação” da PEC.
Ainda segundo o relatório, permanecem como propriedade da União as áreas hoje usadas pelo serviço público federal, as unidades ambientais federais e as áreas ainda não ocupadas.
MMA
Em entrevista hoje à Rádio Nacional, a diretora do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ana Paula Prates, defendeu que esses terrenos, hoje com a União, funcionam como proteção contra as mudanças climáticas.
“Acabar com essa figura é um retrocesso enorme. A PEC termina com essa figura dos terrenos de Marinha, que são terrenos da União, e passa gratuitamente para estados e municípios, para poder, inclusive, privatizar essas áreas”, disse.
A representante do MMA acrescentou que a PEC não privatiza diretamente as praias, mas pode levar ao fechamento dos acessos às áreas de areia. “Na hora em que esses terrenos todos que ficam após as praias forem privatizados, você começa a ter uma privatização do acesso a elas, que são bens comuns da sociedade brasileira”.
Defesa
O senador Flávio Bolsonaro defende, em seu relatório, que a mudança é necessária para regularizar as propriedades localizadas nos terrenos da Marinha. “Há, no Brasil, inúmeras edificações realizadas sem a ciência de estarem localizadas em terrenos de propriedade da União”.
Segundo Flávio, “os terrenos de marinha causam prejuízos aos cidadãos e aos municípios. O cidadão tem que pagar tributação exagerada sobre os imóveis em que vivem: pagam foro, taxa de ocupação e IPTU. Já os municípios, sofrem restrições ao desenvolvimento de políticas públicas quanto ao planejamento territorial urbano em razão das restrições de uso dos bens sob domínio da União”.
O senador fluminense argumenta ainda que a origem do atual domínio da Marinha sobre as praias foi justificada pela necessidade de defesa do território contra invasão estrangeira, motivo que não mais existiria, na visão do parlamentar.
“Atualmente, essas razões não estão mais presentes, notadamente diante dos avanços tecnológicos dos armamentos que mudaram os conceitos de defesa territorial”, disse no parecer da PEC.
Audiência
Na audiência pública desta segunda-feira, a CCJ do Senado deve ouvir a Coordenadora-Geral do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Marinez Eymael Garcia Scherer; a representante Movimento das Pescadoras e Pescadores Artesanais (MPP); Ana Ilda Nogueira Pavã; o diretor-Presidente da Associação de Terminais Portuários Privados (ATP), Murillo Barbosa; o prefeito de Florianópolis (SC), Topázio Silveira Neto, entre outros convidados.
FONTE: JORNAL OPÇÃO