Duas pessoas são estupradas a cada 24h no DF; meninas são principais vítimas

Entre janeiro de 2022 a julho de 2023, a capital do país registrou um total de 1.403 ocorrências de estupro. Homens também podem sofrer abuso, mas a maioria dos casos atinge crianças e adolescentes do sexo feminino

14/08/2023

Na rua, em comércios e até mesmo dentro de casa. Não há lugar, hora e nem idade para as vítimas de violência sexual. Um crime que destrói famílias e é visto como intolerável até entre aqueles que estão atrás das grades por outras infrações à lei. No Distrito Federal, a cada 24 horas, duas pessoas são estupradas. Nos seis primeiros meses deste ano, a polícia registrou um total de 471 ocorrências do tipo. As vítimas, em maioria, são meninas de 6 a 15 anos, segundo dados obtidos pelo Correio por meio da Polícia Civil (PCDF).

Os números constam em um relatório de análise criminal produzido em 4 de agosto e que traz dados sobre estupros cometidos na capital entre janeiro de 2022 a julho de 2023. Nesses 18 meses, foram registradas 1.403 ocorrências de abuso sexual. O que chama a atenção é que, desse total, 901 casos são de estupros contra menores de idade, 505 contra jovens e adultos e sete estupros coletivos.

Meninas entre 6 e 15 anos representam o maior número de vítimas de violência sexual. Entre janeiro de 2022 e julho de 2023, um total de 615 crianças e adolescentes do sexo feminino foram estupradas. Em segundo lugar, ficam as jovens de 18 a 24 anos (199 casos), seguido pelos bebês recém-nascidos até 5 anos (135 ocorrências). No caso de vítimas do sexo masculino, os meninos de 6 a 11 anos ficam em primeiro lugar, com 64 casos. Depois, de 0 a 5 anos, com 53.

Inimigo íntimo

Na maioria dos casos, os abusos são cometidos por pessoas de dentro ou próximas da família da vítima, mostra o levantamento. Nesse período de janeiro de 2022 a julho deste ano, a residência representou 59% do total de casos. Em segundo lugar, com menor representatividade, aparecem os abusos cometidos em via pública (13,6%).

Na última quinta-feira, os investigadores da Delegacia de Proteção à Mulher (Deam 2) prenderam Igor Peterson Barbosa, 37 anos, acusado de abusar de uma adolescente de 15 anos. Aproveitando-se da amizade e da confiança dos familiares da garota, o homem ofereceu uma carona para ela e, durante o percurso, parou o carro e a estuprou. O caso ocorreu em 2019. Mesmo após o abuso, o autor continuou a frequentar a casa da família da vítima e a ameaçava constantemente para que ela ficasse calada. Inclusive, em uma das vezes, tentou violentá-la dentro da residência. Em 20 de junho, Igor foi preso por abordar outra menina no meio da rua. Na ocasião, ele tentou colocar a jovem à força dentro do carro e, felizmente, a vítima conseguiu fugir com a ajuda de populares.

Ainda na quinta-feira, policiais civis da 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho 2) cumpriram um mandado de prisão condenatória em desfavor de um homem, de 50 anos, acusado de abusar de uma menina de 12 anos. O crime ocorreu em 2018, época em que Joeder Andrade Silva era pastor de uma igreja evangélica na região e aproveitava para abusar da vítima, que também frequentava o templo. Ele foi condenado há 12 anos de reclusão em regime fechado.

Abuso

Na semana passada, um caso chamou a atenção da polícia e dos brasilienses depois que uma menina, de 15 anos, residente de Unaí (MG), foi estuprada por um homem, de 35 anos. Em entrevista exclusiva ao Correio, uma pessoa da família da garota detalhou o caso.

A pessoa, que tem a identidade preservada, relatou que a menina começou a se envolver com drogas no meio do ano passado, quando a família ainda morava na Bahia. Em dezembro, as duas se mudaram para Unaí, mas, em meio ao tratamento de recuperação, a menina fugia de casa em busca de drogas. “Passei por muitos momentos de sofrimento, em situações que ela fugia de caso, evitava tomar os medicamentos e não ia para as consultas”, disse. O contato com o crack veio pela primeira vez esse ano já em Unaí.

Segundo a familiar, em 10 de julho a menina foi internada em uma clínica de reabilitação da cidade, onde permaneceu por 17 dias e conseguiu fugir ao pular o muro. No mesmo dia, a família registrou um boletim de ocorrência pelo desaparecimento da adolescente. “Ficamos andando na rua e nada de notícias dela. Em 4 de agosto, abordamos uma pessoa, que a reconheceu pela foto publicada nas redes sociais. Essa pessoa disse que tinha presenciado um rapaz falando que ia para Brasília a trabalho e que ela (a vítima) viria com ele”, contou.

O rapaz em questão é Leonardo Araújo Pereira, usuário de crack. Ele está preso no Complexo Penitenciário da Papuda. Ele e a menina saíram de Unaí pegando carona e chegaram até São Sebastião, no DF. De lá, foram para uma casa em Águas Lindas de Goiás. “Ela sempre teve o suporte da família materna, diálogo e muito amor, não tinha o costume e liberdade para sair sozinha. Nem celular ela nunca teve”, desabafa. No município goiano, a adolescente foi estuprada e obrigada a usar crack, segundo as investigações da 10ª Delegacia de Polícia (Lago Sul). “Eles se separaram e uma pessoa da família dele a retirou de perto do rapaz e a levou para casa”, completou a familiar.

No dia seguinte, o familiar do criminoso entrou em contato com a mãe por telefone e disse que estava com a menina. Ele marcou um lugar no DF para levar a garota e entregá-la com segurança. Leonardo foi preso pela Polícia Militar do Estado de Goiás e teve a prisão flagrante convertida em preventiva durante audiência de custódia.

Acolhimento

Como de praxe em casos de violência sexual, a vítima é conduzida ao Instituto de Medicina Legal (IML) para realizar exames, como foi o caso da adolescente de 15 anos. Para falar como funciona esse protocolo de atendimento, o Correio conversou com o médico Otávio Castello, assessor da direção do IML.

O método de acolhimento e atendimento dessas vítimas é pioneiro no DF e se mantém desde 2008. Logo que a vítima chega ao IML, ela entra por um outro local separado. Quando mulher, a recepção é feita por servidoras enfermeiras também do sexo feminino. “A vítima entra em uma sala de espera menor, onde vai ter ali revistas para ela ler, por exemplo. Uma forma de deixar o ambiente mais confortável. Se for criança, ela fica em uma sala com brinquedos, onde tem pintura especial, carrinhos e bonecas”, afirma.

São quatro salas até chegar ao consultório onde a pessoa será submetida ao exame. Na terceira sala, a vítima passa por uma entrevista com o médico. Já na sala de exames, a mulher costuma receber a chamada “bolsa de crise”. Trata-se de um kit com roupas novas, sandálias, peças íntimas e produtos de higiene. “Ali, é uma forma de dar uma certa dignidade para a pessoa. Além disso, a roupa que ela usava nós podemos recolher para colher um suposto material genético para identificar o possível agressor, por exemplo. Não acontece em todos os casos, mas é um meio”, explica Castello.

A consulta consiste na busca por vestígios da violência sexual por meio do exame na parte genital. Em muitas vezes, outras regiões supostamente agredidas, como nádegas e pescoço, são examinadas. A coleta do material genético permite a alimentação de um banco de dados em que é possível identificar o agressor como o responsável por outros estupros, por exemplo.

Fonte: Correio Braziliense

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