Em razão da “relevância social” do tema, o ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, admitiu o ajuizamento de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) contra o artigo 385, do Código de Processo Penal (CPP). Essa regra permite ao juiz condenar, ainda que o Ministério Público requeira a absolvição.
Conforme a Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), a norma mencionada não foi recepcionada pela Constituição Federal, devendo ser revogada por afrontar o princípio do devido processo legal “em sua dimensão macro”, bem como o contraditório e a imparcialidade do juiz, previstos no artigo 5º, incisos LIV e LV, da Carta Magna.
“Em juízo preambular, considero admissível o trâmite da presente arguição, tendo em vista as asserções na exordial. As alegações demonstram a relevância social da matéria a respeito da possível violação aos preceitos fundamentais mencionados”, decidiu Fachin,.
Os advogados James Walker Júnior, Lenio Streck, Jacinto Coutinho, Marcio Berti e Victor Quintieri representam a Anacrim na ADPF. Eles argumentam que o sistema processual penal adotado pela CF é o acusatório e, desse modo, se o titular da ação penal pública pede no processo a absolvição, não cabe ao juiz condenar ou reconhecer agravantes não suscitadas pela acusação, pois isso infringe o devido processo legal.
Colaborador da ConJur, Streck escreveu artigo sobre o assunto e avançou na discussão formulando duas questões para reflexão: “Qual é o real papel do Ministério Público? É titular da ação penal ou apenas comodatário, sendo que, na verdade, o dono é o Judiciário?”
A regra que a Anacrim considera não-recepcionada e cuja revogação requer diz o seguinte: “nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada”. Para a entidade, embora formalmente vigente, o dispositivo é materialmente inválido, sendo uma “herança autoritária herdada da ditadura Vargas”.
“Não se pode justificar a condenação, nos moldes autorizados pelo artigo 385 do CPP, baseando-se no discurso do interesse público, porque quem pede a absolvição é o Ministério Público, por meio do órgão que representa o interesse público e que detém, por determinação constitucional, o monopólio da titularidade da ação penal pública”, sustenta a Anacrim.
Admitir o contrário, ainda de acordo com a associação, é permitir a participação no processo de um julgador que decide “com fundamento em convicções próprias como exteriorização de sua vontade. Por esse viés, há violação do sistema acusatório, que não permite que o juiz decida para além daquilo que é pedido”.
ADPF 1.122
Fonte: Conjur