Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, afirma que divergência não é pessoal e que não há pressa em reanálise de dividendos
(Folhapress) O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, reconhece que há um conflito entre seu papel e o do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, mas diz ver as divergências como salutares e não pessoais.
“Sempre tive debates acalorados, verdadeiros. Mas debates transparentes sobre o que eu, como governo, defendo na Petrobras; e o presidente da Petrobras, naturalmente, [defende] como presidente de uma empresa. Os papéis são diferentes. Por isso há um conflito”, afirma.
Uma das divergências recentes foi na destinação de dividendos aos acionistas. Prates defendia distribuir 50% dos recursos extraordinários, mas Silveira e o conselho discordaram diante de discussões sobre o fôlego da estatal para investimentos —inclusive em energia limpa.
A decisão final de reter os recursos na empresa causou reação de investidores na bolsa e tirou bilhões em valor de mercado da companhia. Para o ministro, que compara o episódio a uma marola ou ao barulho causado por biscoitos de polvilho, não há pressa para voltar a discutir o tema.
O ministro diz que a diretoria da Petrobras deve ser sempre respeitada, mas evita comentar se Prates está fazendo uma boa gestão —deixando a avaliação para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nos bastidores do governo, é comentada há meses uma possível substituição do presidente da Petrobras.
Silveira diz que a Petrobras será a empresa mais valorizada na Bolsa durante o terceiro mandato de Lula e que não faz questão de indicar nomes para a estatal, mas que não abre mão de sua autoridade nas discussões. “O dia em que você abre mão por um segundo da sua autoridade você nunca mais recupera. Então, a autoridade que me é delegada —e autoridade não é arrogância— eu não transigirei em executar”.
Qual foi a posição do sr. na discussão dos dividendos da Petrobras?
Não houve uma discussão específica sobre os dividendos da Petrobras, sendo muito transparente. Houve uma discussão natural sobre a melhor destinação dos dividendos extraordinários. Sempre lembrando que nós definimos e publicizamos que a Petrobras distribuiria, como fez, 45% de dividendos ordinários. 20% a mais do que determina o piso da Lei das Estatais.
Os extraordinários, quando perguntado ao conselho, ele entendeu e nos convenceu de que o mais prudente naquele momento era primeiro ter acesso ao plano aprovado de investimento da Petrobras, para que ele tivesse seguro para distribuir os demais dividendos. Por isso ele destinou aqueles dividendos a uma conta que pode ser exclusivamente utilizada para distribuição de dividendos no momento oportuno.
Foi um barulho. Foi você sentar em cima de um pacote de biscoito de polvilho. Você fez barulho e depois comeu o farelo, que é gostoso para caramba, até mais gostoso do que comer o biscoito.
Na época da decisão já se sabia que os recursos reservados ficariam nessa conta? E, se sim, por que isso afetaria o plano de investimentos?
Sabia, total. Não é que afetaria o plano de investimentos. O plano de investimentos da Petrobras, aprovado, não depende desse recurso para ser executado, mas depende do nível de endividamento da empresa, nível de contratação de empréstimo, nível de poder de contratação de empréstimo nacional e internacional. Se o presidente da empresa, naquele momento, tivesse votado com o conselho, não teria tido barulho.
Ele ficou contrariado nessa discussão?
Não sei. A pergunta tem que ser feita para ele.
O sr. não conversou com ele?
Ele votou. Ele decidiu votar contra os seus pares no conselho. Ele [na verdade] se absteve.
E como está a relação entre o sr. e ele?
Pessoal, muito boa.
E profissional?
Historicamente, há um salutar debate entre o ministro de Minas e Energia e o presidente da Petrobras, que é vinculada ao ministério. A ministra Dilma [Rousseff] tinha conflitos com o presidente [Sergio] Gabrielli. Sempre houve conflitos. Não houve no governo Bolsonaro, porque o Paulo Guedes não deixava o ministro Bento [Albuquerque] ter acesso ao presidente da Petrobras [Caio Mário Paes de Andrade, na reta final do governo].
O presidente Lula é alguém tão digno, tão competente, tão experiente, tão sensível, que ele nunca promoveu uma reunião com o presidente da Petrobras na minha ausência. Isso chama-se respeito à gestão adequada e transparente das empresas públicas vinculadas a cada ministério.
Sempre tive debates acalorados, verdadeiros, mas debates transparentes sobre o que eu, como governo, defendo na Petrobras, e o que presidente da Petrobras [defende] como presidente de uma empresa. Os papéis são diferentes, por isso há um conflito.
Por que eu chamo de salutar? Porque muitas vezes não é salutar, não é correto, não é lúcido, querer personalizar a disputa. Eu não indiquei diretor da Petrobras. Tive a oportunidade de indicar, confesso. Não faço questão de indicar. Não tenho nomes pessoais para indicar. Não tem nenhuma disputa minha com relação a espaço político na Petrobras, nem do meu partido. Não tem. Meu partido nunca pretendeu espaço na Petrobras.
Se você me fizer uma pergunta: é possível o presidente de empresa, igual à Petrobras, convergir o interesse do acionista com o do controlador? Plenamente possível. Requer humildade, discrição e competência.
O Prates reúne essas qualidades?
Não vou rotular ninguém, muito menos o presidente da Petrobras. Mas estou dizendo que é possível, desde que você preze, trabalhe e tenha essas qualidades.
Quais as divergências entre vocês?
Hoje, nesse momento, nenhuma. Hoje, nesse momento, acho que eu posso ter um pouquinho de tranquilidade e ele pode ter também. Amanhã de manhã pode ser que… tomara que o humor dele amanheça bem.
Vocês conversam com que frequência?
Muita, muita frequência. É difícil uma semana que não tenha alguma coisa assim que seja rotineira. Agora, questões mais estratégicas, todas, absolutamente todas, são discutidas com participação mais do Conselho. A gente conversa com a direção da Petrobras mais através do Conselho do que propriamente da diretoria. Entendo que a diretoria tem uma grande responsabilidade, todos têm que reconhecer que é um grande desafio. Não é para qualquer um.
A diretoria da Petrobras tem que ser uma figura sempre muito reverenciada e respeitada por todos nós. Faço isso com o presidente da Petrobras, que foi meu colega senador. Só que aprendi outra coisa com o [ex-vice-presidente da República] José Alencar. O dia em que você abre mão por um segundo da sua autoridade você nunca mais recupera. Então, a autoridade que me é delegada —e autoridade não é arrogância— eu não transigirei em executar.
E o sr. acha que Prates está fazendo um bom trabalho?
A avaliação da gestão do presidente da Petrobras eu deixo a cargo do presidente da República.
O sr. defende que os dividendos extraordinários sejam pagos?
No momento que a governança da Petrobras, através dos seus conselheiros, achar oportuno.
Já foram representados novos dados sobre investimentos?
Não e acho que não tem pressa.
Não tem pressa?
Por que teria pressa? Está lá, é garantido, é dos acionistas. Está rendendo. Se um dia alguém for lá e tirar um centavo para poder aplicar em outra coisa que não seja lucro, aí eu acho que vai ser justo qualquer barulho. O resto foi, mais uma vez, marola desnecessária. A Petrobras vai ser a empresa que mais vai ganhar valor no terceiro mandato do presidente Lula.
O sr. falou que a Petrobras não pode ter como único objetivo o lucro exorbitante. Qual seria a definição disso?
Um lucro que não cumpra com as missões que estão na Constituição e estão na Lei das Estatais. Que ela seja uma empresa que faça investimento na sua longevidade, na sua perenidade, ou seja, que ela não dilapide o seu patrimônio, como vinha sendo feito no governo anterior, vendendo ativos, distribuindo com dividendos. Sabe o que causou barulho? Os acionistas minoritários, de referência, estavam mal acostumados. Estavam recebendo distribuição de dividendos que não era lucro, que era venda de ativos como lucro. Estava uma delícia, estavam até lambendo os beiços. A empresa tem que distribuir lucro operacional, tem que ser competente.
Entendemos que a Petrobras tem que ser uma empresa perene. Primeiro, na exploração de petróleo e gás. No segundo, de refino. E, terceiro, vai ser uma empresa fortemente e altamente especializada em transição energética. Porque nenhuma empresa no mundo tem mais expertise em plataforma que a Petrobras. E, no médio prazo, a eólica offshore vai ser a grande geradora de hidrogênio verde e, consequentemente, vai poder exportar esse hidrogênio verde para descarbonizar o planeta. O Brasil será o grande protagonista disso.
RAIO-X | ALEXANDRE SILVEIRA, 53
Ministro de Minas e Energia. É delegado aposentado da Polícia Civil de Minas Gerais. Foi diretor-geral do Dnit (entre 2004 e 2005), deputado federal, secretário do governo de Minas Gerais e senador.
FONTE: MAISGOIÁS