Afastamento pode levantar dúvidas sobre posicionamento definitivo do governador goiano no futuro eleitoral que se avizinha, já que o extremismo do momento está relacionado aos bolsonaristas
O governador Ronaldo Caiado (UB) avançou mais algumas casas no afastamento das alas radicais do bolsonarismo e foi, curiosamente, quando criticou o governo Lula (PT) pelo atentado na Praça dos Três Poderes na noite de quarta-feira (13). Ao criticar o presidente, Caiado disse esta semana que Lula não está conseguindo controlar o crime organizado e o “extremismo”.
A fala divulgada pelas redes sociais e depois replicada em outros momentos públicos na quinta-feira (14), como durante a tarde no evento no centro comercial da Avenida 44, entretanto, não atinge só o governo federal pela alegada inação. Atinge frontalmente os únicos segmentos que têm se manifestado de forma extremista no país nos últimos anos, que são os ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
Como vem lembrando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, o ex-presidente era assessorado por um “gabinete do ódio”. Assim, a crítica do governador de Goiás atinge o mesmo setor que se organizava justamente em busca de uma anistia para os atos “extremistas” da tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023.
Ocorre que Caiado vinha buscando herdar o espólio eleitoral de Bolsonaro para se fortalecer como candidato a presidente em 2026. Para se cacifar entre esses eleitores que não terão Bolsonaro na disputa em virtude da inelegibilidade do ex-presidente até 2030 – cada vez mais irreversível, embora Bolsonaro apele até para o presidente eleito nos Estados Unidos, Donald Trump -, Caiado vinha investindo muito, correndo o risco até de se descredibilizar.
Bolsonaro foi quem iniciou distanciamento
Com as falas atuais, no entanto, o governador caminha para um afastamento assumido desse grupo. Muito embora o afastamento das alas radicais não tenha começado por iniciativa própria de Caiado.
Ao contrário. Caiado participou de grandes eventos de apoio ao ex-presidente, como no ato de fevereiro, convocado na Avenida Paulista para Bolsonaro se explicar diante do inquérito sobre as milícias digitais, as mesmas que estimulam atos extremos – comparáveis com o dessa semana. Nessa quinta, circulou um vídeo antigo nas redes sociais em que o ex-presidente gritava a seguidores: “Juro dar minha vida pela minha liberdade”, e pede para o juramento ser repetido pelo público, que ecoa a frase aos gritos.
No dia da manifestação na Paulista, Caiado apareceu correndo com seus seguranças para alcançar o trio elétrico onde Bolsonaro já tinha colocado outros líderes, como o governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos), hoje outro no páreo para 2026. O governador goiano queria porque queria mostrar apoio para ter apoio, mas não deu certo.
Mas o que afastou, repeliu, Caiado, foi justamente o extremismo da campanha do candidato a prefeito de Goiânia apoiado por Bolsonaro, Fred Rodrigues (PL). Cabo eleitoral, o ex-presidente desdenhou de forma “extrema”, e publicamente, do governador goiano e, pior, o fez dentro do quintal de Caiado, onde estava acostumado a degustar de calorosa acolhida no Palácio das Esmeraldas.
Crítica atinge dois alvos
Dessa forma, as críticas à falta de pulso do governo federal poderiam soar pertinentes, mas Caiado atirou em um alvo e acertou dois, não se sabe se propositalmente. E foi a segunda vez nos últimos dias em que isso ocorreu, mas com outro líder político.
Novamente ao criticar o governo federal, dessa vez pelo atentado que matou o corretor de imóveis no Aeroporto de Guarulhos que tinha delatado o PCC e agentes de segurança, o governador goiano mirou em Lula para destacar os problemas na segurança pública.
Mas o alvo da crítica deveria ter sido o governador paulista Tarcísio de Freitas, já que os principais suspeitos são servidores públicos estaduais. Dias depois do fuzilamento do delator, a imprensa divulgou que policiais militares e civis negociavam a morte dele e nunca foram afastados dos cargos mesmo depois que foram minuciosamente denunciados, até que de fato houve o atentado no aeroporto.
Esse afastamento estratégico de Caiado, enfim, pode sinalizar uma tentativa de diálogo mais amplo com a população, mas também pode levantar dúvidas sobre seu posicionamento definitivo no futuro eleitoral que se avizinha.
Texto: Marília Assunção
Fotos: Romullo Carvalho