Em 2022, o Brasil tinha 67,8 milhões de pessoas em situação de pobreza, segundo os dados da Síntese dos Indicadores Sociais (SIS) divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta quarta-feira (6). A quantidade é equivalente a uma fatia de 31,6% da população sobrevivendo com até R$ 637 por mês, ou R$ 21,23 por dia.
Já a proporção de pessoas em situação de extrema pobreza, sobrevivendo com até R$ 200 por mês –ou R$ 6,67 por dia–, ficou em 5,9% da população brasileira no ano passado, o que equivale a 12,7 milhões de pessoas.
Na comparação com o ano interior, os dados do IBGE indicam que a proporção de pessoas abaixo da linha da pobreza caiu 5,1 pontos percentuais (p.p.) após a máxima histórica atingida em decorrência da pandemia.
“Em 2021, apesar da continuidade da pandemia ocorreu um recuo na participação das transferências (Bolsa Família e Auxílio Brasil). Isso fez com que ocorresse novamente o aumento da pobreza”, avalia o analista socioeconômico do IBGE, Jefferson Mariano.
“Com as taxas de desemprego muito elevadas o resultado direto foi a queda nos rendimentos dos trabalhadores e o recrudescimento da pobreza.”
Mariano explica que a redução em 10,3 milhões de pessoas que deixaram de viver em situação de pobreza entre 2021 e 2022 se deveu a recuperação da economia, a redução nas taxas de desemprego e a retomada de políticas de transferência de renda.
Sem os pagamentos de benefícios de programas sociais, a proporção de pobres subiria 12%, alcançando uma fatia de 35,4% da população brasileira em 2022, enquanto a parcela de miseráveis seria 80% maior, abrangendo 10,6% dos habitantes do Brasil.
Os programas sociais respondiam por 67% do rendimento domiciliar das pessoas em situação de extrema pobreza em 2022, enquanto a renda obtida do trabalho correspondia a apenas 27,4% do rendimento deste grupo. Nos domicílios considerados pobres, os benefícios de programas sociais representavam 20,5% dos rendimentos, e a renda do trabalho, 63,1%.
Em um cenário hipotético com a ausência dos auxílios, a proporção de pobres teria aumento de 12% no país, passando dos atuais 31,6% para 35,4%.
O recorte de extrema pobreza seria ainda expressivo: aumento de 80%, de 5,9% para 10,6% da população do país, conforme os dados do IBGE.
O índice, que mede a desigualdade na distribuição de renda da população, teria sido 5,5%, passando dos atuais 0,518 para 0,548.
Segundo o IBGE, a taxa de desocupação da população brasileira caiu de 14% em 2021 para 9,6% no ano passado.
Contudo, o número ainda se mantém acima do patamar registrado em 2020 (31%) e da mínima histórica registrada em 2014 (30,8%).
Sobre os números mais baixos em 2020, o analista do IBGE explica que naquele ano “houve queda na pobreza especialmente em decorrência das políticas de transferência de renda”.
Perfil da pobreza no país
Crianças
Em 2022, a proporção de crianças menores de 14 anos de idade abaixo da linha de pobreza foi de 49,1%. A proporção de crianças brasileiras vivendo em situação de pobreza extrema foi de 10% em 2022.
No grupo etário de 15 a 29 anos, 34,9% viviam na pobreza, e 6,3% estavam em situação de miséria. Por outro lado, na população idosa, com 60 anos ou mais, 14,8% viviam em situação de pobreza, e 2,3% sobreviviam na extrema pobreza.
Dentro dessa faixa, 10,9 milhões de indivíduos não estudava nem trabalhava em 2022, ou uma fatia de 22,3% do grupo etário.
De acordo com o IBGE, dos quase 11 milhões de jovens que não estudam e seguem desempregados, 61,2% se encontram abaixo da linha da pobreza. Dentro desse recorte, 47,8% eram mulheres pretas ou pardas.
“As aposentadorias e pensões têm um peso extremamente significativo na redução da pobreza e da extrema pobreza”, justificou o pesquisador do IBGE André Simões.
Raça
Além da faixa etária, a questão racial também indica vulnerabilidade. Entre os brasileiros pretos e pardos, 40% viviam em situação de pobreza em 2022, praticamente o dobro da proporção de brancos (21%) nessa situação.
No grupo de negros, 7,7% estavam sobrevivendo em condição de pobreza extrema, enquanto que entre os brancos essa incidência era reduzida a menos da metade: havia 3,5% de miseráveis no grupo de brancos.
“Os números da pesquisa destacam que a despeito de pequenas mudanças no curto período persistem as profundas desigualdades sociais. Como ressaltado no texto, é um quadro estrutural de desigualdades”, observa Mariano.
No texto da pesquisa, o IBGE destaca que “o arranjo domiciliar formado por mulheres pretas ou pardas, sem cônjuge e com filhos menores de 14 anos concentrou a maior incidência de pobreza: 72,2% dos moradores desses arranjos eram pobres e 22,6% eram extremamente pobres”.
Regiões
Mais da metade dos miseráveis do país moravam na região Nordeste (54,6%). Outros 23,8% moravam no Sudeste; 11,9% eram da região Norte; 6% do Sul; e 3,7% do Centro-Oeste.
Quanto à população vivendo em situação de pobreza, 43,5% estavam no Nordeste; 30,7%, no Sudeste; 12,8%, no Norte; 7,7%, no Sul; e 5,3%, no Centro-Oeste.
Na passagem de 2021 para 2022, todas as regiões registraram reduções na proporção de habitantes vivendo tanto na pobreza quanto na miséria.
O recuo na pobreza foi maior no Centro-Oeste, onde foi registrada queda de 7,3 p.p., para um total de 21,3% da população local vivendo nessa situação.
“O Centro-Oeste registrou a maior queda na pobreza em 2022 porque o mercado de trabalho da região foi bem dinâmico em 2022. A massa de rendimento cresceu bastante. Provavelmente isso está relacionado às atividades da agroindústria, e provavelmente teve efeito na redução da pobreza”, disse Simões.
A região Nordeste ainda tinha mais da metade de seus habitantes (51%) em situação de pobreza em 2022. No Norte, 46,2% dos moradores eram pobres.
“Norte e Nordeste registraram as maiores quedas na extrema pobreza em 2022”, lembrou Simões.
O contingente de miseráveis no Nordeste diminuiu 5,8 pontos porcentuais em 2022, para um total de 11,8% da população local sobrevivendo na extrema pobreza.
Já no Norte, a fatia de miseráveis caiu 5,9 pontos porcentuais, para 8% dos moradores locais vivendo em situação de extrema pobreza.
“Os domicílios mais vulneráveis têm peso maior dos benefícios sociais”, explicou o técnico.
Renda
O IBGE lembrou que o rendimento médio domiciliar per capita no país subiu 6,9% em 2022, para R$ 1.586. Apesar da melhora, o avanço não recuperou as perdas ocorridas nos anos de 2020 e de 2021, permanecendo 4,9% abaixo do patamar pré-pandemia, de 2019.
Na passagem de 2021 para 2022, o rendimento médio domiciliar per capita das pessoas pretas ou pardas aumentou 11,8%, para R$ 1.163, enquanto o das pessoas brancas avançou 3,5%, para R$ 2.118.
Contudo, apesar de a população de pretos e pardos ser maioria no mercado de trabalho (54,2%), o grupo teve uma média de renda menor que da população branca.
O rendimento-hora da população ocupada branca (R$ 20,10) foi 61,4% maior que a de pretos ou pardos (R$ 11,80), de acordo com os dados da SIS.
Ao observar o rendimento médio real, a disparidade é ainda maior. Os brancos (R$ 3.273) ganharam 64,2% a mais que os pretos ou pardos (R$ 1.994) no período avaliado.
“Os diferenciais de remuneração entre a população negra e branca refletem os problemas relacionados a inserção no mercado de trabalho. É importante destacar porque muitos empresários afirmam que isso não seria possível, uma vez que pagam os mesmos salários, independentemente da raça/cor. O que ocorre é que em alguns setores de atividade econômica a presença da população negra é muito reduzida”, explica Mariano.
“Mesmo nos setores nos quais há maior presença de negros, estes acabam ocupando posições operacionais e raramente tem oportunidade de mobilidade. Assim auferem os menores rendimentos, a despeito de qualificação ou escolaridade”, conclui o analista.
Fonte: CNN