Política

Preso na Operação Vampiro fechou R$ 647 mi em contratos sob Bolsonaro

Empresa de Marcelo Pitta já recebeu ao menos R$ 597 milhões. Empresário ainda responde a ações relativas a denúncias de fraude em licitação

A empresa Panamerican Medical Supply, que tem como um dos sócios Marcelo Pupkin Pitta, firmou dois contratos volumosos, no total de R$ 647,2 milhões, com o Ministério da Saúde, em 2021 e 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os contratos, para fornecimento de imunoglobulina humana, ocorreram após licitação feita em 2021 e somavam inicialmente R$ 517,8 milhões, mas tiveram o incremento de dois aditivos.

Marcelo Pitta é figura conhecida no mercado farmacêutico, e já foi preso no âmbito da Operação Vampiro, em 2004 e em 2007. As investigações apuraram suspeita de fraude em licitação no Ministério da Saúde, justamente em compras de medicamentos hemoderivados, incluindo imunoglobulina. A ação fraudulenta teria começado ainda na década de 1990, e a investigação chegou a envolver o senador Humberto Costa, ministro da Saúde na época, mas ele foi absolvido.

Do valor dos dois contratos assinados em 2021 e 2022 pela Panamerican, ao menos R$ 597,5 milhões já foi pago, segundo Portal da Transparência, sendo que 73,1% foi desembolsado no ano passado, entre março e setembro, e o restante neste ano, já no governo Lula.

Os contratos são relativos a 625 mil frascos de imunoglobulina, incluindo as quantias previstas nos dois aditivos firmados em agosto do ano passado. Todos os medicamentos foram entregues entre fevereiro de 2022 e abril deste ano. A maior parte, 500 mil, foi importada até dezembro de 2022.

Imunoglobulina é um medicamento hemoderivado, ou seja, produzido a partir do sangue, usado para melhorar a imunidade de pacientes acometidos por uma série de doenças, como a síndrome de Guillain-Barré.

Os contratos firmados no governo Bolsonaro foram com a chinesa Nanjing Pharmacare, e a Panamerican consta nos documentos como representante nacional da empresa.

Imbróglio

O pregão que gerou os contratos foi alvo de imbróglio após decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que o suspendeu. A ação se deu após representação de uma empresa questionando sua desclassificação do processo depois de o ministério ter alegado que o produto oferecido não atenderia às exigências previstas no termo de referência.

A suspensão foi revertida por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou as compras do contrato com a Panamerican firmado na época, entendendo que havia risco de desabastecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). O acordo em questão era para a compra de 300 mil frascos do medicamento.

Na ação penal desencadeada pela Operação Vampiro, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu, em 2020, pela impossibilidade de punir Marcelo Pitta em relação aos crimes de associação criminosa e fraude em licitação. O processo envolve outras pessoas e ainda tramita, mas está sob segredo de Justiça.

Existe também um processo de improbidade administrativa, sobre a denúncia de fraude em concorrências internacionais, com conluio de empresários e pagamento de propina a membros da comissão de licitação do Ministério, que também tramita no TRF1.

A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) aponta, dentre outros elementos, que escutas telefônicas feitas pela PF identificaram que Pitta e outros empresários fizeram um acordo de divisão do mercado de hemoderivados, especificamente em relação às concorrências internacionais apuradas pela ação.

O MPF, então, pede condenação com ressarcimento ao erário no valor de R$ 27,5 milhões, de forma voluntária (ou seja, paga por todos os envolvidos).

Marcelo pede que a ação seja julgada improcedente apontando problema com as provas de interceptação telefônica. Segundo ele, as transcrições foram feitas de forma equivocada pelos policiais federais responsáveis. O caso ainda tramita.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), corre outra ação envolvendo Pitta, dessa vez sem relação com a Operação Vampiro. Há um recurso do MPF contra uma decisão do TRF da 3ª região, que entendeu que a Justiça Federal era incompetente no caso e anulou a ação que condenava o empresário e outros envolvidos em primeira instância. O MPF entrou com recurso defendendo que o caso é de competência da Justiça Federal, e aguarda decisão.

A ação, de 1998, também é de improbidade administrativa, relativa à época em que Pitta era diretor de uma fundação ligada a um hemocentro, em São Paulo. A investigação foi iniciada pela Procuradoria da República de São Paulo, que apontou, dentre outros pontos, o uso de recursos públicos para despesas sem processo licitatório e venda de plasma.

Nesta terça-feira (26), o Metrópoles mostrou que, em março, a empresa goiana Auramedi Farmacêutica firmou um contrato com dispensa de licitação no valor de R$ 285,8 milhões com o Ministério da Saúde, também para fornecimento de imunoglobulina, na condição de representante nacional da chinesa Nanjing Pharmacare.

A Auramedi tem apenas um funcionário registrado, ao menos até março, capital social de R$ 1,3 milhão e tem como único sócio Fábio Granieri de Oliveira. A reportagem esteve na sede da empresa na última sexta-feira (22/9), em horário comercial, mas não havia ninguém no local.

No processo de tomada de preços que a Auramedi acabou selecionada, a Panamerican também se apresentou como representante da Nanjing no Brasil.

A Panamerican chegou a pedir a impugnação do processo de dispensa de licitação em questão, solicitando melhoria do termo de referência. Apesar do pedido de impugnação, o que mostra ciência da existência do processo, a empresa não enviou proposta.

No processo licitatório de 2021 que rendeu dois contratos à Panamerican, chama a atenção outra empresa que venceu parte do pregão e firmou dois contratos menores, de R$ 74,5 milhões. A empresa também é de Aparecida de Goiânia, assim como a Auramedi, e é ré em uma ação de improbidade administrativa que Fábio Granieri também é réu.

A ação popular corre no Tribunal de Justiça do Pará. Um dos elementos no processo é o fato de Fábio ter participado da tomada de preço solicitada pela prefeitura como representante da Auramedi, mas também ter assinado como representante dessa outra empresa, que era sua concorrente.

O outro lado

A Panamerican não tem restrição para ser contratada pela administração pública, conforme Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), usado para consulta pelo governo.

A reportagem procurou a empresa, mas ela não respondeu. Na segunda-feira (25/9), um funcionário afirmou que não iriam responder. O Metrópoles também busca contato com advogados de defesa de Marcelo. O espaço segue aberto para manifestação.

O Ministério da Saúde não respondeu a respeito dos contratos firmados com a Panamerican.

Fábio Granieri, da Auramedi, se limitou a dizer que “é surpreendente que informações equivocadas estejam sendo veiculadas a respeito da Nanjing Pharmacare” e que são “desprovidas de fundamentação fática”.

Fonte: Metrópoles

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